segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

À espera

Espécie de criativa

Pode não parecer, mas tem a espera, essa longínqua palavra redonda, carácter de quietude, que se assume frequentemente, em inquietude permanente, no vai-não vai da esperança do que virá, se vier, pra depois logo se ver. Uma espécie estática de definição, que tanto tem de bom, como de desesperante e errante, porque quem espera, desespera! A menos que nada se espere, que daí “tudo o que vem é grato”, como do facto, diria Fernando Pessoa. A menos que nada mais se continue a esperar, nesse corredor de sensações, para evitar profundas desilusões.

Mas se temos de esperar, como nos versos de Cora Coralina, “ que seja para colher a semente boa que lançamos hoje no solo da vida.” (…) ou “então que seja para produzir milhões de sorrisos, de solidariedade e amizade.”

Nesse vai-não-vai de frágeis definições, deslizam intenções e brotam vibrações, embalando na indiferença da espera, à espera que o caso se entorne, e vire interrogação do acaso, dando azo a especulação. Dando brado a interpretações dúbias, in dubio pro reo, quando o réu sou eu! E se esperei, esperei, se não esperei, andei.

Na dúvida, invocamos Clarice Lispector, “que medo alegre, o de te esperar”. Invocamos, meditamos e contornamos, até encarar de frente uma espera que pode trazer na bagagem a doce sensação de infortúnio. Ou uma inscrição definida na arte de decifrar, para mais tarde contemplar, nesse futuro a chegar. Se chegar!

Na dúvida também, esperamos por Godot, invocando absurdos, nas malhas de um diálogo cinzento, até partirmos, sem sairmos do lugar, dessa espera que se faz luar, dessa luz que não acende, nem se entende, na encruzilhada do vagar. E vamos, sem saber se esperamos, enquanto não chegamos, enquanto Godot não chega.

As flores que colhemos, dão-nos cores que queremos, como presentes que não esperamos, nem abraços, nem beijos que afectuosamente retribuímos. E não precisa ser afeto, nem tão-pouco amor seleto, basta o gesto, que delicadamente esperamos, por entre demandos e desencontros, entre diferentes pontos de vista, que a cisma dita, nessa espera de desdita. E assim ficamos, no virar da esquina, numa espécie de triângulo, quase quadrado, pouco ou muito ousado, entre um lado e o outro, e talvez outro e outro, na vã tentativa de perceber aonde chegar. Ou numa quase quadratura de círculo, a andar à roda, em modo devagar, andando e em jeito de esperar, esperando.

No fim, se chegar, chegou, se não chegar, ou fico ou vou, consoante o tempo e o vento, o modo e o lugar, o querer e o não querer, para não ter que chorar, para não ter talvez de amar. E assim, na procura de um caminho, por aqui me fico, por aqui me vou, sentado, à espera!

MJB, 16/12/2013


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