quarta-feira, 10 de março de 2010

Dandies e Párias

O Blogue feito pelos leitores
A propósito do texto sobre os Arrogantes Intelectuais, recebi do leitor do blogue V. R. os seguintes textos que publico para partilhar com todos:
OS DANDIES

Aparecem sempre nas mais diversas ocasiões quer se trate de manifestações culturais, lúdicas ou estritamente sociais.

Abre um novo bar ou restaurante, estão lá no primeiro dia e, de imediato, se tornam íntimos.
Apresenta-se um livro ou inaugura-se uma qualquer exposição, eles estão lá.

Decorre um ciclo de conferências ou um debate político, em que se prevê que altas esferas estejam presentes, eles estão lá.

Chegam tarde, mostram-se à plateia e saem prematuramente, fazendo sala nos foyers ou nas antecâmaras, de preferência com algo líquido na mão. No final estão lá – para os canapés, os cumprimentos de despedida ou a incursão ao bar ou ao restaurante.

São sempre muito solidários com o sucesso dos outros (em especial os artísticos), elogiam o talento e o esforço alheio, não se lhe conhecendo algo de semelhante, porque se limitam a mostrar-se, a passear-se por bares e outros espaços nocturnos, fazendo figura de muito modernaços, escapando sempre às funções trabalhosas ou que exigem esforço - nas associações exigem sempre lugares na Assembleia Geral, de preferência, como presidentes.

Raramente se manifestam, não se lhes vê especial obra, nascida da sua iniciativa, ou em que algo de seu ou da sua pessoa possa correr riscos. São especialistas em arriscar aquilo que é dos outros, beneficiar dos dinheiros públicos, gastar à tripa forra quando é do orçamento autárquico. Daí que a sua trajectória política seja sempre um certo tipo de “navegação à vista”. Mantêm-se junto do grupo dominante, de preferência num segundo plano, esperando sempre o momento óptimo para o ataque, felino e decisivo, ao bodo central (que, felizmente, raramente acontece).

Elegantes, bem vestidos, de graça fácil e com um discurso sempre adequado às mais diversas situações, sabem ser graciosos com as damas e um pouco mais grosseiros quando a plateia aconselha alguma boçalidade.

São assim os dandies, profissionais do saber-estar, borboleteando na nossa sociedade, desafiando, por vezes, a aplicação dos mais elementares princípios do conhecimento humano - não se lhe aplica o Princípio de Peter (uma vez que se alcandoram, quase sempre, para cargos, que não funções, muito acima do que permitiria a sua incompetência) nem tão pouco a Lei de Lavoisier uma vez que se mantêm à tona, recebendo a impulsão vertical, de baixo para cima, proporcional à imensidão da sua mediocridade.
E nós a vê-los passar ...


V.R.


OS PÁRIAS

Este vocábulo de origem indiana foi adoptado na linguagem figurada portuguesa com o significado de indivíduo excluído do convívio social ou pertencente à classe mais desprezada da sociedade. Eram também identificados com os ilotas, que na sociedade espartana da Grécia Antiga, fora privada de seus haveres e reduzida a condições de trabalho humilde.

No sistema de castas hindu, os párias eram os impuros, ou intocáveis, situando-se abaixo da última das quatro castas (a dos camponeses e artesãos).

Após a II Guerra Mundial, como forma de se opor à opressão bramâne, convertem-se ao islamismo, alterando a correlação de forças político-religiosa na Índia, obrigando à introdução de significativa melhoria na sua condição social, ao mesmo tempo que obtinham o apoio de figuras do pacifismo como Ghandi. Contudo, apesar de algumas alterações nas suas condições de vida, continuam, por vezes, por escolha própria, a viver em condições inferiores, com tarefas sociais desqualificadas.

Foi um termo que, por força da evolução das sociedades foi caindo em desuso, em particular, nas sociedades ocidentais embora o vocábulo, na sua evolução semântica, tenha ainda hoje cabimento para referenciar um certo tipo de nossos concidadãos que, pela forma como se comportam, por vezes ao longo de uma vida inteira, merecem plenamente a designação de párias da nossa sociedade.

Porque nunca produziram nada de significativo, durante a sua vida activa, canalizam todas as suas energias para a maledicência e a crítica destrutiva de quase tudo aquilo que a sociedade vai construindo. Por inveja e má formação, eles, que toda a vida se mostraram incapazes de gerar o que quer que fosse (nalguns casos nem sequer um filho), reúnem-se em tertúlias, se não secretas pelo menos fechadas sobre si próprias, onde segregam a sua bílis contra todos aqueles que se distinguem positivamente no meio social ou, em especial, para aqueles que, por os conhecerem de longa data, lhes votam um olímpico desprezo ou os ignoram, pura e simplesmente.

Podiam ficar satisfeitos com aquilo que, afinal, esta sociedade, que tanto desprezam e ominam, lhes concede atribuindo-lhe reformas chorudas, conseguidas, muitas vezes, à custa de artificiosas contagens de tempo de serviço. Mas isso não lhes é suficiente. Não veriam assim satisfeitos os seus mais baixos instintos de verdadeiros párias, com o sentido de seres desprezíveis – próximos das páreas que o nosso povo apelida a placenta e membranas que envolvem o feto, depois do parto (também chamadas secundinas).

Bem aplicada seria, neste caso, a inspirada frase publicitária, há uns anos tornada publica nos nossos meios de comunicação social: “E não se pode exterminá-los?”

V.R.

1 comentário:

Anónimo disse...

Por acaso, os últimos três parágrafos do texto "Os Párias" parece ter sido feito de propósito para retratar a actuação de um pária da sociedade senense que gasta o seu tempo e energia a infernizar a vida de quem abnegada e voluntariamente trabalha para o bem estar de outros (em última análise para o bem colectivo).
Parece que só pelo prazer de chatear sem que da sua intervenção resulte qualquer benefício para alguém, nem sequer para si próprio.