Uma espécie de criativa
Nada bulia, nem a ventania, era mesmo melancolia. Assim, sem
mais, ocorreu discorrer sobre o que não mexia, impulsionados na circunstância
de querer descrever esta doce significação do estado da alma em certa parte
desvalorizada. Tão só, melancolia!
Se for por falta de entusiasmo, vá que não vá, sempre pode
curar-se com impulsos, gotas de acção ou doses moderadas de estímulos, a ver no
que dá. Mas se for já em adiantado estado de depressão, é sinal de que afinal
tudo se desequilibrou, precipitou e por ventura deixou de ser a circunstância
do termo, para ser algo mais grave.
Na ténue esperança de abordar definições o mais perto do
cerne, sobra a predisposição ao largo do termo, esse fatídico termo que a tanto
português se agarra, como marca, como estigma de um modo de ser que não anda,
nem age. E assim se atola na indiferença e na indefinição de acção, meio cá,
meio lá, como por entre os pingos da chuva, à espera que algo floresça, que
algo aconteça. Uma espécie de fado, esse tom magoado, a embalar para a
negritude da alma, na fundura dos dias que se elevam em eloquências por vezes
criativas, por vezes aflitivas, mas quase sempre a andar sem sair do lugar.
Saindo daqui, gemendo
e cantando na melancolia dos dias, como se os dias tivessem culpa, enrolamo-nos
no fácil, naquilo que não nos esforça, não nos consome, e vamos, à espera! Na
melancolia das tardes, na melancolia das noites, esperamos sentados, na vã
esperança de nos desembrulharem a alma. É como ir e não ir, querer e não querer
e na hesitação, enrolar a inspiração de um fúnebre cigarro, chupado até ao fim,
a ver o que acontece.
Vai e não vai, o pensamento é assim, corta não corta, sem
querer ou propositadamente e sobra sempre essa história de não fazer por falta
de assunto, quando afinal é melancolia, tédio e tudo. É falta de empenho, é degradação da alma
lusa, esse estado de espirito que se apodera, se aloja e se despoja, sem margem
para impulso que rasgue esse bulício de corda atado no pensamento.
Ainda se enriquecesse a alma! Mas não há volta a dar e
acabamos na mais sublime das preguicites
agudas, inebriados pela cor da doce adrenalina que corre em nossas veias. E por
estarmos tão próximos, por descendermos ao largo, acabamos por espraiar-nos
nesse humor de negro em que se veste a nossa dor. O nosso luto, esse estado
próximo de um narcisismo ferrenho que não nos larga e nos impele a elucubrações
impiedosamente sentidas.
Mas vamos e não vamos, na rotina melancólica que assola os
nossos dias e com estação própria do ano. Começa no outono e vai até ao fim do inverno,
neste inferno de quietude, com muitos apeadeiros, muitos lamentos e frenesins
escassos. Embrulhamos no frio a doce magia a que chamamos melancolia,
aconchegando à luz ténue dos dias, a inusitada inspiração que leva mais à preguiça
do que à criatividade esperada. É duro, mas consequentemente não saímos do
lugar, deste posteiro donde tantos navegadores partiram, outrora avessos a
melancolias.
Pode não parecer, mas dá sempre ar de inútil e incapaz de
amar, o que não se solta desta frente, que não faz mais do que deixar para trás
a motivação de quem não consente marasmo e se afoita sempre “às do cabo”.
Invariavelmente suportamos o fardo, e dizemos que é fado,
inato estado de alma, este espirito que nos anima no desânimo de querer ser o
permanente inspirado no lado da criação. Criar, criamos e até cremos e
queremos, mas a curtas distâncias, nas impiedosas voltas de quem não vai além
de um inovador bocejo. De onde se avista o mar de ideias, falha a presunção de
pragmatismo e acabamos por ficar, porque afinal é o destino. E assim fazemos e
assim andamos neste comboio de corda curta, outrora caravela em mares
atlânticos. Mas acreditamos, temos fé e deste sítio de onde nos espraiamos,
havemos de chegar lá, a um qualquer destino, neste destino de fado que a
melancolia nos transformou.
Seia, Portugal, 30 novembro 2013
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