Espero
que esta minha carta os encontre à procura de melhor saúde mental,
na expetativa de melhores dias, em todos os teatros de operações
diariamente frequentados.
O
desejável era que não fosse, mas a estatística diz-nos que sim,
que há fortíssimas probabilidades de estar no clube dos “desalmados
de burnout”.
Uma elite a que aderem cada vez mais, à proporção do stress físico
e emocional e respetiva exaustão e sentimentos de ineficácia a eles
associados.
De
facto não acontece só aos outros, por isso me lembrei de si, que
certamente é um de seis que sofre a bom sofrer, silenciosa e
delicadamente. Um dos expostos a esse danado stress laboral crónico
que o deixam em baixo ou de baixa. Carregado de lapsos de memória,
de falta de concentração, impaciência, irritabilidade, fadiga ou
enxaqueca, ou dores, ou insónias, ou desânimo, ou baixa
auto-estima, ou desespero constante ou outra coisa qualquer não
recomendável no livro da psiquiatria.
Se
está neste lote, é quase de certeza uma das vítimas
de quase bullying laboral,
ora de lideranças frágeis e frouxas propícias à desmotivação,
complicadas ou arrogantes, ora de sistemas toscos e sisudos e
ambientes obscuros, ora ainda de ameaças e medos a emergir na
concorrência feroz e atroz.
Como
deve saber, o importante é saber o que lhe faz mal, circunscrevendo
o diagnóstico e a partir daí colocar o foco nas coisas boas,
arredando da ação e do pensamento tudo que é tóxico. E claro,
como vem nos manuais, evitar conflitos e mexericos, sorrir e adotar
formas de vida saudável. Ou como diria o outro, dividir o dia em
três partes. Oito horas para trabalhar, oito para dormir e outras
oito para o lazer e família. E não é preciso ser rico para ser
assim, porque nas horas de lazer e família está o busílis. Se
convivemos com os amigos, se praticamos desporto, se vamos ao cinema,
se ouvimos música, se lemos, se pescamos, se deixamos os assuntos
laborais no local de trabalho e vice-versa e se e se. Nem precisamos
fazer o pino, apenas saber separar o que é do trabalho e o que é da
família.
Cara
senhora ou senhor, se não está neste clube de “desalmados
de burnout”,
não se ria porque a qualquer momento pode estar. Se já está ou
quase se sente membro desse inferno, saia enquanto é tempo, para não
se infernizar e enfermar a si e aos seus. Nem precisava que lhe
lembrasse, mas nunca é demais recordar, como nunca é demais treinar
a mente para estes exercícios do que deve e não deve, para não
sofrer e perder. Olhe que é na alegria que está o ganho e na
inteligência emocional de que nos falam.
Mesmo
na adversidade laboral ou familiar, lembre-se que quase estamos
condenados a aturar-nos uns aos outros, por isso use as suas defesas
e não pense que tudo isto é moralismo prosélito. Continue a
colocar paixão e criatividade no que faz e faça você mesmo por
criar ambientes propícios à colaboração e entreajuda e sobretudo
procure meter na gaveta a arrogância de quem o martiriza. E de
caminho, se poder, meta lá dentro a pessoa, não hesite!
Só
se vive uma vez e se lhe disserem que no trabalho não precisamos de
ser amigos, cultive a amizade, mesmo na adversidade e sorria e siga e
surpreenda os seus pares sempre que for oportuno. Ofereça flores ou
chocolates, cante, dance, conviva sempre que puder, e não apenas no
Natal, porque como se diz no Carnaval, a vida são doiSem exageros,
nem tanto ao mar, nem tanto à terra, para que não lhe apontem o
ditado de “muito riso, pouco siso”, enverede pelo meio do
caminho, que é onde pode estar a virtude ou a bondade. Tanto em casa
como no trabalho, em terra ou no mar, muitos ditados se aplicam a
tempestades, porque onde há duas pessoas há um potencial de
conflito e de ondas. E quem quer ver o caráter de uma pessoa, dê-lhe
um pouco de poder, e constate a crispação na maré alta da
presunção de que se fala.
Na
gestão de conflitos e sobretudo nas relações interpessoais é que
está o segredo e não há que ter medo, siga, descontraia e se for
preciso medite, que a meditação é a oração dos honestos.
A
terminar, formulo votos de melhoras ou cautelas, conforme os casos e
não se esqueça que é possível viver feliz e triunfar na vida,
mesmo numa pocilga de inquietação ou no reino da hipocrisia.
Bom
Natal!
Seia,
Dezembro 2019
Observador, 14 dez 2019, 00:084
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