A propósito da instalação de uma superfície comercial no
lugar de uma das mais emblemáticas fábricas têxteis do concelho, entretanto
desactivada e no seguimento de desabafos
e conjecturas entretanto feitas, ocorreu-me abordar esta temática por se
relacionar com o processo de desenvolvimento do concelho de Seia.
Durante décadas, no concelho de Seia prevalecia uma mono-indústria,
a dos têxteis, de que Lúcia Moura aborda no seu livro O Concelho de Seia em
Tempo de Mudança (1997), com enfoque nesta indústria dos finais do século XIX
ao desabar da 1ª República. Um sector que prevaleceu, até ao séc. XX, desabando
esmagada pela invasão de produtos chineses, na década de 90. O impacto poderia
ter sido muito desastroso para o concelho, pela super-dependência desta indústria,
mas graças à intervenção do poder politico, os encerramentos foram feitos
paulatinamente, apesar de algum sofrimento. No período áureo, estimava-se que estivessem
empregadas nesta indústria e vários subsectores, cerca de 3 mil pessoas, entre
Fisel, Vodratex, Fercol, Vila Cova, Loriga e Santa Marinha. Foi um período
próspero, impulsionado por um homem: Joaquim Fernandes (1915 – 1996), no
próximo dia 9 de Dezembro completam-se 20 anos após a sua morte.
Essa é a questão, quando um concelho está demasiado
dependente de uma fonte de riqueza.
Naturalmente que em paralelo se desenvolveu a actividade de
aproveitamento hidro-eletrico, mas de menor impacto na absorção de mão de obra,
sobretudo depois de feitas as barragens e centrais da Estrela.
Como a necessidade aguça o engenho, com a queda dos têxteis
outras pequenas indústrias foram emergindo e hoje podemos referenciar o sector
de calçado, através de investimento alemão, mas significativo. Podemos igualmente
referenciar o sector dos lacticínios, quer através das queijarias artesanais, quer através das várias fábricas de queijo,
que abastecem os mercados nacionais e internacionais. Um sector a necessitar de matéria prima, ou seja leite de ovelha bordaleira, para poder expandir ainda mais. Fenómeno idêntico ao da produção de medronho, que tem uma procura imensa no mercado dos anti-oxidantes. Acrescenta-se ainda nesta área de negócios com peso na economia local os relacionados com os vinhos, o pão, a fruta, o mel e os enchidos.
Neste paralelo, surgiram os chamados call-center’s, mas é o mercado
turístico, com o incremento dos alojamentos, restauração, lojas de produtos,
que ganha espaço e relevo no quadro económico do concelho. É evidente que
tirando o agro-alimentar, que se impôs graças ao empenho de agentes
empreendedores, a área do artesanato em geral não logrou render muito para a
nossa região, porque, tirando os Chinelos da Avó, resultantes também de
dinâmica empreendedora de uma jovem local, não temos um produto dito artesanal
da Serra da estrela que se tenha imposto no mercado.
Em paralelo, surgiram alguns serviços que se reputam de
muito importantes, no quadro do desenvolvimento local, particularmente na área do
ensino, como sejam o incremento da Escola Superior de Turismo e Hotelaria, do
ensino artístico da Escola Profissional da Serra da Estrela e do Conservatório
de Música. A intervenção destes e de outros estabelecimentos e instituições, sobretudo
da área social, que têm igualmente forte impacto na economia local, tem entroncado
na estratégia do município, que tem feito da cultura e do ambiente, factores de
desenvolvimento local. Uma estratégia que tem passado igualmente por
incrementar o espírito empreendedor dos jovens, através de intervenções nas
escolas e instituições, que tem dado frutos, mas ténues. E vários são os
factores que estrangulam o apetite de investimento nesta região, a começar pelos
decorrentes da Interioridade, que todos já conhecemos.
Apesar disso, não podemos baixar os braços, nesta quadra de
capitalismo selvagem, que não tem forma de impedir que se instalem um número indefinido de supermercados numa pequena cidade de um dia para o outro. Já
houve a fase em que todos abriam pastelarias, depois seguiu-se a fase do fim do
monopólio das farmácias e agora não há regras nem entidades reguladoras que nos
valham.
Apesar de conhecermos as transformações operadas e os novos paradigmas surgidos, não podemos desistir de continuar a
incrementar o espírito empreendedor, para que os jovens percebam que não basta
procurar emprego, mas sim procurar criar empresas para gerar investimento e
criar riqueza, independentemente das angústias e outros constrangimentos
associados.
Apesar de se saber que nunca foi tão difícil como agora
abrir um negócio, criar uma indústria, com tantos “custos de contexto” como
pomposamente lhe chamam, porque só quem tem de pagar as contas todas ao fim de
cada mês, sabe o que custa ser empresário e empreendedor.
E aqui como no resto, resta acrescentar que já todas as
frases foram inventadas para salvar o mundo, falta apenas uma coisa, salvar o
mundo!
MJB
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