"De volta a casa, depois de testagem negativa, após 12 dias em quarentena, com resultado positivo.
segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021
Dentro do Lar, com Covid, no surto, sem susto
quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021
O Cinema enquanto ferramenta de promoção de valores ambientais
Jornal Público, 5 de fevereiro de 2021
Escrevo este texto, sobre a importância do cinema na promoção dos valores ambientais, a partir da minha experiência enquanto diretor e fundador do CineEco – Festival Internacional de Cinema Ambiental da Serra da Estrela. Uma história contada na primeira pessoa, num percurso de 25 anos, que nos traz à atualidade um evento organizado pelo município de Seia, no quadro de programação cultural deste concelho do interior do país.
Se em 1995, quando, no âmbito das atividades do município de Seia, lançámos o festival, os filmes se apresentavam numa versão minimalista e com laivos de moralismo, focados sobretudo na natureza, hoje ampliou-se de forma gigantesca o olhar de temáticas relacionadas. O ângulo de abordagem nos mais de 600 filmes apresentados anualmente a concurso, oriundos de mais de 40 países, é cada vez mais alargado a temáticas diversificadas, já que hoje quase tudo tem a ver com questões ambientais.
1.
Ao longo dos anos foram sobressaindo numa primeira linha os filmes-documentário que, normalmente, retratam o mundo natural e frequentemente desastres ambientais e uma certa “sacralização apocalíptica”; numa segunda linha, filmes que assumem como tema questões ‘ambientalistas puras’, evidenciando frequentemente protagonistas ‘defensores da natureza’ (tal como o já popular Erin Brockovich) e, por fim, os de animação, inscrevendo-se representações simbólicas das visões do homem sobre a natureza.
Temáticas pertinentes, com propósitos de alterar hábitos, afirmando-se alguns festivais, não só como eventos, mas acima de tudo como movimentos capazes de gerar mudanças de comportamentos nas pessoas. Numa espécie de gestos locais para mudanças globais, onde os jovens e as crianças têm papel central. A confirmação de alguns fenómenos como as alterações climáticas, as ameaças à biodiversidade, o esgotamento de recursos, entre outros, colocaram na agenda mundial a tomada de consciência da crise ambiental de carácter global.
Em face destas ameaças cada vez mais presentes, nos atropelos aos valores ambientais e de sustentabilidade, emerge o imperativo de mudança. De um modo geral e de forma simplista, o foco coloca-se sobretudo na necessidade de redução de uso de plásticos, na redução de consumo de carnes e outros alimentos compostos, e de uma maneira geral na redução da emissão de gases com efeito de estufa provenientes de industrias, transportes, agricultura ou resíduos.
Verifica-se no entanto, a implementação recente de uma certa moda ambiental, em que muito é feito pela sustentabilidade, porque fica bem ou por que impressiona ou vende. No entanto, nem sempre é assim, como revela Werner Boote no seu filme Mentira Verde (The Green Lie), que abriu o CineEco 2018, onde se denunciam multinacionais que vendem produtos verdes, mas que no fundo não passam de estratégias de marketing para vender mais, em nome do ambiente. Daí o papel decisivo das curadorias na elaboração das programações, entrando em linha de conta com os Critérios de seleção dos filmes – qualidade artística e história que o filme conta e relevância para problemas atuais e autenticidade cientifica. Por isso, acentuamos a tendência para o critério da esperança, para que não seja apenas a “triste realidade” mas também casos de sucesso. Não só nos filmes para crianças mas também para o público em geral.
2.
Neste contexto, importa sublinhar a importância do cinema enquanto ferramenta que permite partilha de conhecimento, assim como área de fornecimento de pistas de aprendizagem capazes de abrir portas à reflexão. Que levem a questionar, a inquietar e a operar mudanças de comportamento, sobretudo quando falamos de cinema enquanto recurso educativo. E aqui, entra em linha de conta a importância de problematizar estratégias de linguagem, operadas em filmes eco-ambientais, de cariz educacional.
Filmes, enquanto objetos artisticos e ferramentas pedagógicas, capazes de demonstrar a importância das artes para mudanças de paradigmas nas sociedades contemporâneas. Neste caso concreto das questões de ambiente e sustentabilidade, podemos dizer que o cinema é uma ferramenta muito importante e que dá os seus frutos. E tanto maior é o contributo, quanto maior é o leque de intervenção. Quantas mais sessões, mais ações e inciativas se multiplicarem, seja nos auditórios, nas escolas ou outros espaços alternativos. E de preferencia com o impulso de festivais de cinema, para darem mais consistência à ação e missão.
É um facto indesmentivel que nos últimos anos tem disparado o surgimento de festivais de cinema no mundo e neste caso em particular, de cinema ambiental. Isso também se deve ao incremento muito abundante de produções cinematográficas focadas nas questões ambientais. Festivais que desafiam, inspiram e motivam as pessoas a sair e tentar fazer a diferença nos seus mundos e em particular nos universos escolares.
Naturalmente que os festivais são fenómenos das industrias culturais, mas também da emergência de novos problemas das sociedades contemporâneas a braços com ameaças e problemas de sustentabilidade que tocam de perto todos os cidadãos do planeta. Festivais de cinema de ambiente, que constituem um universo à parte. Entre 1999 e 2010, registou-se um pico de criação de festivais desta temática e hoje, no calendário de realizações, concentram-se sobretudo em nos meses de abril, maio e junho e outros nos meses de setembro, outubro, novembro.
Tematicamente restritos, mais do que plataformas de circulação de eco-cinema, constituem-se como pontos de encontro onde os cineastas e o público interagem. Ou seja, espaços e lugares onde emerge a natureza democrática da participação popular, com conversação, diálogo e estimulo à criação e participação.
Neste quadro de ação dos festivais, a Educação Ambiental cumpre um desígnio importante, um serviço público que emerge em várias plataformas e projetos, para dar contributos vários. Para formar públicos, para despertar o gosto pelo cinema e pelo ambiente, para despertar consciências e formar cidadãos. Um desafio duplo, entre a magia do cinema e a emergência de preocupações e visões de natureza ambiental.
Entendemos por isso, que além da difusão do gosto cinematográfico, o cinema ambiental tem sido um instrumento primordial na promoção da educação ambiental junto de escolas. No caso concreto do CineEco, isso é feito em Seia, no decurso do festival, mas também em mais de 40 cidades portuguesas, através da sua vasta rede de extensões, exibindo filmes e estabelecendo diálogos, em interação dinâmica e motivadora.
Dessa forma, dão-se pequenos contributos para a formação de cidadãos mais esclarecidos a nível ambiental, no sentido de poder permitir a defesa de um bem-comum. Nesta matéria, predomina o género de animação, como forma de chegar mais próximo do público-alvo, neste caso, as crianças. Género animado e atrativo, de modo a suscitar interesse e entusiasmo e assim ajudar na ampliação de públicos para o cinema ambiental.
3.
Em nosso entender, é possível um filme apresentar um problema, denunciar determinado atropelo aos valores ambientais, mas ao mesmo tempo contar uma história e por fim apontar caminhos para uma solução sustentável. Tornar o filme ambiental como objecto artístico atractivo, desmistificando a ideia de filme eco-chato.
Empoderar a juventude através da educação ambiental para a adoção de um estilo de vida saudável é um dos propósitos dos festivais, de uma maneira geral e que foi reforçado no I Fórum Internacional de Festivais de Cinema de Ambiente que organizámos em Seia no CineEco 2018. E fomos bem sucedidos, ao ponto de Giulia Braga, responsável de Comunicação Externa do Banco Mundial e Connect4Climate, ter revelado disponibilidade em apoiar jovens realizadores e cineastas com base na proliferação de uma plataforma sobre o clima, no sentido de influenciar decisões políticas de uma forma positiva. Uma posição reforçada no mesmo fórum por Catherine Beltrandi, representante da UNEP – Departamento de Ambiente das Nações Unidas, para quem é importante a envolvência e mobilização das Universidades em todo o mundo.
No fundo, pretende-se que os alunos aprendam a utilizar o conhecimento para interpretar e avaliar a realidade envolvente, para formular e debater argumentos, para sustentar posições e opções, competências, consideradas fundamentais para a participação ativa na tomada de decisões fundamentadas, numa sociedade democrática, face aos efeitos das atividades humanas sobre o ambiente.
Já agora, podemos dizer que os intervenientes deste 1º Fórum de Festivais de Cinema Ambiental reconheceram ainda a importância da componente cientifica para reforço da confiança no trabalho apresentado e um elemento chave no esclarecimento das populações. Concluiu-se igualmente pela importância do desafio comum dos festivais na criação de novos públicos, uma componente determinante da missão de cada festival. Uma missão de serviço público, que é levar os jovens a gostar de cinema e a despertar os seus olhares e consciências para as questões ambientais. No âmbito da maximização do impacto dos festivais de cinema ambiental nos seus países de origem, foi igualmente consensual o poder de impactar o público em geral, mas também a classe política para a tomada de ações concretas. No caso português emerge uma certa urgência na cooperação entre as tutelas do Ambiente e da Educação, de modo a que estes ministérios possam reforçar o trabalho no domínio da Educação Ambiental. E neste particular, o Cinema assume-se como importante ferramenta para cumprimento desta missão tão premente quanto nobre.
4.
Chegados aqui, reiteramos a importância da promoção da sensibilização ambiental, assim como o incremento do diálogo aberto, crítico e reflexivo sobre os novos desafios ambientais. Nesse quadro, colocamos esse desafio e foco na realização de eventos de natureza científica e de divulgação, como são os festivais. Nesse particular, colocamos igualmente o ordenamento do território, a biodiversidade e a geodiversidade, considerando o impacto das alterações climáticas, na dimensão adaptação e mitigação, o uso eficiente de recursos e a valorização do território. Um desafio que considere o ordenamento do território e a conservação e valorização do património — natural, paisagístico e cultural — como elementos centrais que nos permitem viver bem dentro dos limites do planeta, incluindo a adaptação às alterações climáticas.
Incrementar boas práticas ambientais e sobretudo as de educação para o território, cujo potencial e valorização, se afiguram cada vez mais como desígnio premente e imprescindível nos dias de hoje. Nesse sentido, considera-se igualmente relevante que a natureza em todo o seu esplendor, seja vista como um ativo político e turístico, de que resulta a importância da sua preservação assim como da valorização das culturas tradicionais, como imperativos das nossas comunidades e entidades responsáveis.
Seia, Janeiro de 2021
Mário Branquinho, Diretor do CineEco | Seia
https://www.publico.pt/2021/02/05/opiniao/opiniao/cinema-ferramenta-promocao-valores-ambientais-1949408?fbclid=IwAR1icCSYDA003A01qapqYJIsCpDYyFv3eV4QUnpNPuZvfEMVycLJfVx1iL4
domingo, 20 de setembro de 2020
UM DIA AINDA HAVEMOS DE FALAR DISTO, Diário de quarentena
Diário de quarentena 1
...
Já lá vai mais de um mês. Confinamento forçado, como quase todo o mundo.
Como nunca antes visto ou imaginado. Em casa, dia após dia, em tarefas
domésticas, em teletrabalho, a lavar sistematicamente as mãos, refrescando a
alma, a lavar loiça, a colocar mascara, a escrever, a ler e a ouvir, a proteger
os mais velhos na distância, sem abraços , a tentar perceber, a ver notícias
repetitivas, e contabilidade de mortos e feridos e a repetir gestos mínimos por
metro quadrado. A pensar se não é tudo ficção, assumindo a constatação de que
afinal isto tinha de dar-se.
O mundo estava a ficar perigoso demais, e há muito se pronunciava o velho
jargão de que "Isto um dia rebenta"!
O mundo abateu-se sobre as nossas teimosias e por força disso está agora o
conta-quilómetros a colocar-se a zero, para começarmos tudo de novo. Ou não, e
isso é ainda mais intrigante. Pode tudo não passar de um susto, quando se
inventar uma vacina, quando se inventarem desculpas para voltarmos à louca
corrida em direção a novo abismo de consumismo desenfreado e outros atentados à
nossa casa comum.
Meio alheios ao que nos espera, seguimos, na quietude da casa, entre o
quarto, a sala e a cozinha. Um dia de cada vez. Lavamos loiça, limpamos o pó,
passeamos o cão, ouvimos as notícias, contamos mortos e ensaiamos o regresso ao
trabalho. No pico da saturação, à procura de um planalto para as nossas
emoções, não baixamos a guarda. Afastamos euforias, porque o caminho ainda é
longo e salvando a pele, queremos salvar o sustento, trabalhando.
Serenos, acendemos a vela da esperança, na certeza de comemorar abril, na
estranha liberdade confinada ao tempo que vivemos.
Mário Branquinho, 19 de abril 2020
Diário de quarentena 2
.......
Em teletrabalho, ou no regresso ao
trabalho efectivo, os dias passam, ora lentos, ora depressa. Afinal isto já
leva tempo demais. Começa, no entanto, a levantar-se o cerco, tenuemente,
deixando meio mundo, meio confuso, meio intrigado, de como será o regresso à
normalidade, se voltar a haver normalidade.
Há mais carros na rua e pessoas a
circular e na televisão dizem que a curva continua a baixar. Ergue-se a
esperança. O perigo dos Lares de idosos continua a pairar, apesar de não se
baixar a guarda.
Há um senhor que diz que o 25 de abril
está a dividir os portugueses e isso é mau. É um feriado para celebrar a
liberdade recuperada em abril de 1974 com a revolução dos cravos, a agora, caiu
o caos da celebração, com tudo preso em casa e meio mundo indignado porque se
chegou a isto. Sem necessidade. O melhor é no sábado, combinar-se uma hora e
virmos todos à varanda ou à janela e cantarmos o Grândola Vila Morena.
Diz no noticiário que a Espanha é o
terceiro país do mundo com mais casos a seguir aos Estados Unidos e Itália. Que
no Brasil está um louco no Palácio do Planalto, uma espécie de Manuel Joaquim
das Couves a envergonhar o seu povo e a colocar vidas em perigo. E nasce um
movimento para o expulsar de lá.
Nas ruas à noite, na minha zona,
circulam mais gatos que o habitual. Vai a gente colocar o lixo e alguns felinos
mansos e ternos, seguem-nos, como se fossemos os donos. Será do tempo, ou
andarão angustiados pelo desânimo dos verdadeiros donos?
Leio no Diário de Noticias que o governo
e a Santa Casa vão dar dinheiro para ajudar a manter os jornais do país e que
se for à proporção de leitores, o CM será o mais beneficiado. Apesar das
mentiras que diz e das perseguições que faz, diz o texto que leio. Não é justo!
O responsável das pequenas empresas diz que está a haver demora na libertação
de empréstimos e isso pode levar à ruína muito negócio e criar muito
desemprego. Continuamos na ponte entre salvar vidas e salvar negócios. Não é
fácil, mas sabíamos que isto ia doer. Está a doer e não se sabe quando e como
acaba.
Há dias que não se pode sair de casa e
eu só tentei ver o que se passa ao redor.
Mário Branquinho, 20 de abril de 2020
Diário da quarentena 3
.......
Por estes dias até perdemos a noção dos
dias da semana. Mais um dia e muitas historias. A novela da atualidade é a da
comemoração do feriado do 25 de abril no “confinaParlamento”. Já vai com muito
enredo e no episódio de hoje soube-se que antigos presidentes não vão e que
outro vai contrariado, e que o ajuntamento será menor. Não se percebe como
aceitam lá pessoas com mais de 70 anos!
Fora disso, ouvimos dizer que quem se
safa na pandemia são as grandes superfícies, que não param de vender e de
subir. Os pequenitos dos produtores não, afundam-se. Fazem falta campanhas de
promoção dos produtos da agricultura familiar. Estará na hora de abrir os
Mercados Municipais, para ganharmos todos. E amanhã é o dia da terra.
O que não está certo á a publicidade
enganadora do Pingo Doce, que ainda por cima, não tem pingo de vergonha, porque
ganha cá e paga impostos na Holanda.
Espantoso é o consumo de combustíveis a
cair vertiginosamente. Fechados em casa, deixamos de andar de carro e as
fábricas, pouco trabalham. Na América já pagam 37 dólares o barril a quem
quiser ir lá carregar. Mas não parece haver interessados. A esmola ´é grande, o
pobre desconfia. Não será fácil, difícil será mobilizar cântaros e cisternas.
Na televisão portuguesa, ou melhor, em
todas, o ministro da economia, Siza Vieira, diz que estamos perante a mais
violenta contracção da história da humanidade. Oxalá das contracturas nasça a
Esperança!
Enquanto isso, o presidente brasileiro
decidiu juntar-se a uma manifestação que pedia uma intervenção militar para
derrubar o Congresso e o Supremo Tribunal Federal Brasileiro. No mesmo dia
especula-se que o líder da Coreia do Norte estará muito mal de saúde, e que um
controverso virologista francês, premiado pela pesquisa sobre o HIV, acredita
que o vírus saiu de laboratório em Wuhan, na China.
Que diremos nós, no meio deste caldo
caótico?
Lavamos mãos, colocamos máscaras,
coçamo-nos com os cotovelos, fazemos ginástica em casa, inventamos ocupações e
dormimos mais que o costume na intranquilidade e na engorda dos dias. E fazemos
por esquecer que o mundo é cada vez mais um lugar estranho, que até Edgar Morin
diz que as certezas são uma ilusão! Serão?
Seia, 21 de abril 2020, Mário Branquinho
Diário da quarentena 4
...
Continua o estado de alerta e o
confinamento.
Muitos de nós trabalham, outros
teletrabalham e outros não. A vida fica difícil, entre angústia e esperança,
até que isto passe.
Nas televisões debitam incessantemente
números de mortos e feridos, por países e por comparação. Em Portugal fala-se
de alivio, que só pode ser perigoso se baixarmos... a guarda. Para já há
restrições no feriado prolongado do 1º de maio. Não se pode ir onde se quer. O
25 de abril vai ser à varanda e o resto logo se vê.
Um senhor que falou agora na televisão é
apologista da abertura progressiva do setor económico, para isto não morrer
tudo. É preciso começar a desenhar o regresso a uma vida mais
"normal", com abertura de cabeleireiros, cinemas, ginásios, hotéis,
restaurantes, faculdades e creches, pelo menos.
Na televisão o Presidente da América
acaba de dizer que se as pessoas injetarem um liquido nas veias, limpam os
pulmões e manda-os apanhar sol. No Brasil o Presidente diz que não é coveiro e
o seu ministro da Justiça Moro, anuncia demissão e diz que Bolsonaro queria
mexer na Polícia Federal para ter acesso a relatórios de inteligência. Já se
fala em Petistas aplaudindo o juiz golpista.
Segundo os jornais, a Alemanha
prepara-se para uma segunda vaga do coronavírus que pode ser "mais dura
que a primeira".
Magia é acreditar num mundo melhor,
mesmo que ele piore a cada dia, como dizia o Outro. Isto não está fácil, em
tudo que é grande e no muito que é pequeno ou invisível. Anda tudo misturado,
nesta crise sanitária, económica e de petróleo. Só o ambiente melhorou. O céu
ficou mais azul, a água mais limpa e o ar mais respirável. Vamos ver onde isto
nos vai levar, mesmo parados em casa, ou no trajeto casa- trabalho, trabalho –
casa. E não está certo haver tanto cócó de cão nas ruas de certas zonas
residenciais ou o Zé Malhôa ver a GNR à porta, por dar música aos moradores da
zona.
Seia, 24 de abril 2020, Mário Branquinho
Prossegue este tempo historicamente
bíblico. E com ele assinalamos palavras novas e outras repetidas até à
exaustão. Coronária vírus, quarentena, pandemia, confinamento, isolamento,
contingência, calamidade, fadiga, covid, vírus , dgs, sms, oms, máscaras, viseiras,
ventiladores, luvas, álcool, desinfectantes, lares, velhos, idosos, curvas,
picos, planaltos, infectados, testes, testados, mortos, vacinas, matemáticos,
epidemologistas, videoconferências, teletrabalho, moratórias, lay off, take
away, encerramentos, cancelamentos, adiamentos, Trump, Bolsonaro, gatos,
caezinhos e por aí fora.
As redes sociais e as televisões
animam-nos e desanimam-nos, proliferam eventos virtuais, seguem iniciativas de
todos e cada um de sua casa e assim nos ocupamos. Falta-nos sol e sobra-nos
tempo.
As ruas continuam desertas, os
comércios, escolas e outros serviços fechados. Cresce-nos o cabelo, sobra-nos
tempo, falta paciência, falta negócio e dinheiro e adiam-se eventos. Aumentam
incertezas, espreitam esperanças, vive-se um dia de cada vez.
Não saímos à rua de cravo na mão, mas
saímos de máscara e estranhamente até entramos mascarados nos bancos e não
assaltamos. E num dia como hoje, vêm-nos à memória uma frase batida, como se
fosse o primeiro dia do resto das nossas vidas, por evocarmos a liberdade em
tempo de reclusão. Com canções de abril, do Zeca, do Godinho e tantos outros
que fizeram da canção uma arma e nós quase sem fazer nada.
Cresce o cabelo e cresce a ilusão de
ficarmos bem, apesar do medo, apesar do vírus, apesar dos chineses, apesar de
tantas palavras, apesar de tudo e até dos presidentes da América e do Brasil.
25 de abril 2020, Mário Branquinho
segunda-feira, 13 de abril de 2020
O “amigo Zeca de Seia” provoca onda de solidariedade com máscaras e viseiras
Aproveitando todos os restos de acrílico da sua oficina, recicla-os e quando dá conta, está a distribuir mais de mil viseiras pelo comércio local, GNR e outras instituições de diversos pontos do país. Tudo gratuitamente. E a máquina de corte da sua oficina não para. Tem cortado mais em quinze dias do que nos últimos meses. Já depois de acabar todo o acrílico que havia por ali no pavilhão, foi encomendando mais, até chegarem mais sobras de outras empresas, sensibilizadas pela sua ação, ligando-se a esta rede solidária deveras impressionante. Tão impressionante como a simplicidade do Zeca, dedicado por vezes mais de 16 horas por dia à causa, fazendo e distribuindo, orientando e explicando sempre que “não é nada”, apenas disponibilidade e colaboração. Tem havido pessoas a querer pagar e lá vai explicando, pausadamente, que não, que é gratuito, que é para proteger quem precisa ser protegido, no trabalho, na saúde e na vida confinada que se abateu sobre todos.