Dá
que pensar não pensar muito, assim como soa estranho, passarem os anos, quase
meio século e nós redobrados nas nossas interrogações e incertezas do caminho.
Do percurso que fazemos, das histórias de vida concebidas, dos sonhos e
realidades conseguidas, assim como de tudo o que fomos capazes de enfrentar,
nas alegrias e nas tristezas, no bom e no mau que decifrámos. Um caminho
alucinado de esperanças e iluminado de crenças, umas vezes bem-sucedidos,
outras frustrados, mas quase sempre assentes na banalidade efémera das causas,
por não durarem como queríamos.
Dá
que pensar, lembrando quando fomos crianças e sonhámos em ser crescidos e pelo
meio do caminho recebermos doces e rebuçados, jogos, prendas e enamoramentos e
muitos divertimentos. Podemos incluir memórias de tempos e momentos de parcos
recursos e aqui e ali dalguma dor, por ser normal, mas sempre felizes, com
quase nada.
Dá
que pensar lembrar como fomos crescendo, sonhando pela normalidade de quem quer
emprego e posses e família e filhos e carro e casa e mesa e roupa lavada e tudo
o mais que leve a um padrão de conforto, além do que pudesse vir por direito
próprio. Como também a lembrança da caminhada que foi prosseguindo, nem sempre a
melhor, por tantas vezes optarmos por males menores em nome de estabilidade, em
nome de princípios e regras e normas, com amor, com dedicação e sempre, mas
sempre com denodada entrega ao trabalho, malfadada sina de quem não sabe fazer
mais nada.
Dá
que pensar não poder fazer a caminhada contrária, da cova às entranhas, como no
estranho caso de Benjamin Button. Uma interrogação de quem chega a um provável
meio caminho e se desdobra nas encruzilhadas, entre impulsos e recalcamentos,
vontades contidas e desejos incontinentes e amiúde inconsistentes.
Dá
sempre que pensar, mas chegados á ponta de onde se começa a ver vários fins de
ciclo, de amigos que partiram e tempos que não voltam, quase explodimos. Quase
saímos da repetição dos dias e das horas, das rotinas que acenam tontas e quase
diluímos preconceitos de quem não está para mais nada senão para ver e sentir.
De quem já ouviu de tudo e não quer saber de mais nada, de quem já perdeu e já
ganhou, de quem já foi avisado e de quem mais ninguém se lembra se não for
notado.
Pode
parecer estranho desfiar assim um rosário de contas deitadas à vida, desta
forma redonda, mas pode impor-se assim, sem mais.
Pode
parecer estranho, mas só resvalando nalgumas inquietações, numa dose moderada
de interrogações, escutando imprudentes silêncios, se pode augurar o sabor dos
efeitos colaterais de um atrevimento de sentido contrário à norma.
MJB, 10 de Dezembro de 2015
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